Em 1835, a Câmara Municipal de Angicos encaminhou carta aos Deputados Provinciais, onde fazia a defesa da Vila diante da possibilidade dela ser dissolvida.Transcrevo para cá o texto desse documento, que encontrei no IHGRN, que trás importantes informações da nossa História.
A Câmara Municipal da Vila de Angicos desta Província do Rio Grande do Norte, persuadida que há quem pretenda representar a Vós Ilustríssimos e Excelentíssimos Senhores Deputados Provinciais, para ser dissolvida esta Vila, alegando ser falta d'água, de materiais para construção de casas, de meios para sustentação dos habitantes, e de cidadãos capazes por conhecimento para exercer os Empregos Públicos, julga, esta Câmara, ser do seu dever, levar ao Vosso Conhecimento Ilustríssimos e Excelentíssimos Senhores Deputados Provinciais, que esta Vila não tem falta d'água como dizem, pois tem uma Cacimba que não falta água ainda nos anos mais rigorosos de sêca, e juntamente um olho d'água, que a dá com abundância, e nunca seca, acrescendo haver grandes poços, que recebendo água do inverno, duram quase todo ano, e o terreno é tal que sempre se conserva muito clara e sem corrupção, servindo uns poços para a lavagem de roupa e banhos, e outros para beber-se.
A planta da Vila é agradável e oferece (maravilhosa) vista, tem terreno suficiente para se fazer muitas casas, há dentro da Vila muito barro para telha, e tijolo, e muita pedra, que dá boa cal, e não se querendo fazer as casas de tijolos, podem se servir de pedras, pois há em abundância. O terreno desta Vila, Ilustríssimos e Excelentíssimos Senhores Deputados, tem de comprimento mais de quarenta léguas, e de largura quatorze dezesseis, e dezoito, é povoado por mais de cinco mil almas e é dividido o povoamento em três grandes distritos com as denominações de Santa Anna do Mattos, Angicos, e Guamaré e em cada um se vê uma boa Capela, sendo Angicos o do centro do termo, como até assim reconhece a Câmara da Vila de Princesa, como se vê dos Artigos das Atas juntos, e por assim ser, oferece muita comodidade aos habitantes do Município a se reunirem no ponto da Vila.
No Distrito de Santa Anna do Mattos se fazem grandes plantações em uma Cordilheira de Serra, e de Guamaré é o ponto desta Província onde há mais armadilhas de pescarias, sendo facílimo entrar para a Vila o preciso para sustentação dos habitantes, acrescendo ser todo Município povoado de Fazendas de Gado que o fertiliza, ficando por isto demonstrado que a Vila de Angicos não padece falta de mantimentos, e até os que precisa da Praça de Pernambuco, desembarcados no lugar das Oficinas, chegam em carros com dois dias de viagem. Tendente a falta de Cidadãos de conhecimentos para os Empregos Públicos seja lícito a esta Câmara dizer, que se esta falta fosse bastante para ser dissolvida a Vila, então deveria ser dissolvida a Cidade da Paraíba, por ter a Câmara da Capital procedido a nomeação de Promotor Público, e eleição de Jurados por meio de eleitores de Paróquia, como se vê no correio oficial do ano passado, nº 87; também deveria ser dissolvida a Capital de Pernambuco, onde uma junta de Paz tomou deliberações tendentes a moeda de cobre, privativo a Assembléia Geral Legislativa, e de cujo procedimento foi a junta acusada pelo Promotor Público; deveriam ser dissolvidas as Capitais das Províncias do Ceará e Maranhão pela deliberação que tomaram relativa ao cunho, e valor da moeda de cobre, o que só é da competência da Assembleia Geral Legislativa; deveriam enfim ser dissolvidas quase todas as Cidades, e Vilas do Império Brasileiro, por terem praticado atos ilegais, umas por falta de conhecimento, e outras por caprichos. O certo é que os Empregados Públicos da Vila de Angicos não tem praticado erros consideráveis no desempenho de seus deveres, e se os tem praticado em matéria leve, desse-lhe as desculpas que se dá aos mais Empregados das Vilas da Província, e se os tem em matéria grave, sofram as penas da Lei, e não seja a Vila dissolvida por erros, que por falta de conhecimento praticaram os Empregados.
Esta Câmara, Ilustríssimos e Excelentíssimos Senhores Deputados vos certifica que a maioria dos povos de seu Município deseja que seja a Vila confirmada no ponto de Angicos, como está criada, por terem os (ilgível) mais pertos do que tinham quando eram sujeitos a Vila de Princesa, e por que esta Câmara não duvida acreditar que a boa ordem que há em seu Município seja alterada se a Vila for dissolvida, tomou a deliberação de levar o exposto ao vosso conhecimento Ilustríssimos e Excelentíssimos Senhores Deputados, para que tomem em consideração o negócio que não é de pequena monta por pender do bem estar dos Povos, que se esperam dos vossos atos legislativos, todo seu cômodo, paz, e sossego, delibereis Ilustríssimos e Excelentíssimos Senhores Deputados como vos ditam a vossa Alta Sabedoria.
Esta Câmara, Ilustríssimos e Excelentíssimos Senhores Deputados, aproveita a ocasião para vos pedir aceiteis o seu devido cumprimento, aplaudindo o dia em que cada um de vós prestarem juramento e posse do muito alto Emprego de Legislador, que dignamente haveis desempenhar.
Deus Guarde por muitos anos a vós Ilustríssimos e Excelentíssimos Senhores Deputados. Vila de Angicos em Sessão Extraordinária de ( ilegível) Janeiro de 1835
Antonio Francisco Bezerra da Costa, Alexandre Lopes Viégas e Azevedo, João Manoel da Costa e Mello, Francisco de Borja Soares Rapozo da Câmara, Antonio Lopes Viégas e Azevedo, José Teixeira de Souza, Miguel Francisco da Costa Machado.
Os sete componentes da Câmara Municipal faziam parte de um núcleo familiar. Eram todos parentes consangüíneos ou por afinidade do Patriarca da região, o português João Barbosa da Costa. Por exemplo, Antonio Francisco, João Manoel e Miguel Francisco eram primos legítimos e, respectivamente, meu tetravô, meu tio-trisavô e meu trisavô. Francisco de Borja era sogro de duas filhas de Miguel Francisco. Alexandre Lopes e Antonio Lopes eram netos de Anna Barbosa da Conceição, filha de João Barbosa. José Teixeira era parente dos Lopes Viégas.