João Felipe da
Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN,
sócio do IHGRN e do INRG
Eis-me pisando sobre o solo de Mossoró (10 de agosto de
1861), lugar de minhas simpatias, e que incontestavelmente virá a ser um dos
pontos mais importante da província pela vantajosa posição topográfica em que
se acha.
Colocada em uma extensa e linda esplanada que se alonga até
a barra, 7 léguas ao sul, a Vila de Mossoró contém um sofrível povoado, cujo
número de edifícios talvez exceda de 120, e um comércio já bastante agitado até
ali se observa.
O Reverendo Vigário Antonio Joaquim Rodrigues, que, como os
habitantes de Apodi, jazia também em dúvida a respeito do dia certo em que o
Exmo. Sr. Presidente deveria ali passar, foi quem, indo ao seu encontro já
quase dentro da rua, ofereceu a sua casa para o nosso alojamento, tratando-nos
com aquela afabilidade e franqueza que lhe são tão notáveis.
Conta Francisco Othílio, relator da viagem, que foi
convidado para ir à casa de umas moças, que haviam também assistido à festa no
Caicó, para ouvi-las tocar violão e flauta e cantar algumas modinhas, tendo se
dirigido para lá em companhia do inspetor João Carlos, amigo da família. Aí faz
o seguinte comentário: quem tem visitado a nossa capital onde a maior parte das
moças é tão acanhada, e sem gosto para música, que juízo não fará dos mais
lugares! Eu, porém nesta viagem fui testemunha do contrário, encontrando moças
verdadeiras apreciadoras de música, e até de alguma instrução.
Ás três horas da tarde (do dia 11) principiaram a chegar os
cavalos para o nosso transporte, e às 5 horas já perdíamos de vista alguns
edifícios da Vila de Mossoró, da qual me apartava com saudades. Neste trajeto
teve S. Exc. de visitar um armazém que existe na distância de uma légua,
pequeno receptáculo de diversos gêneros que são exportados daquela Vila em
barcaças, as quais nas enchentes das marés chegam até ali; depois do que
tomamos o caminho que devia levar-nos a Macáo, pernoitando-se na Fazenda Umari,
duas léguas distante de Mossoró, onde chegamos favorecidos pelo astro da noite
que já derramava um pequeno clarão. E assim às 3 horas da madrugada deixamos
Umari, chegando-se ao lugar denominado Entrada, pequeno povoado da costa entre
Macáo e Mossoró, às 10 horas.
Descansamos em casa de um homem, de nome João Filippe, o
qual nos hospedou segundo a sua posição e circunstancias, suprindo algumas
falhas, que todavia não eram para estranhar em um lugar como aquele falto de
certos recursos, os seus modos afáveis.
Seriam pouco mais ou menos 3 horas da tarde, quando deixamos
a Entrada, tocando às seis horas na Ponta do Mel, onde nos demoramos somente
enquanto tomávamos uma fartada de peixe fresco, em casa do senhor Paulo Gomes
da Costa, que já prevenido se achava de que por ali passaríamos; continuando
depois a nossa marcha para Cacimbas de Vianna, fazenda do Major José Martins
Ferreira, aonde chegamos às dez horas da noite.
Duas noites e um dia foi quanto nos demoramos em Cacimbas de
Vianna, onde passamos muito bem, não só em razão do cavalheirismo com que fomos
tratados pelo major José Martins Ferreira, mas também pelas comodidades que
oferece aquele agradável sítio.
Ainda estávamos desfrutando o agradável sono da madrugada do
dia 14 quando um homem nos bateu à porta anunciando que em um porto distante
dali meia légua pequena se achava uma barcaça convenientemente tripulada para
transportar-nos a Macáo, acrescentando mais que algumas pessoas que deviam
acompanhar-nos se achavam a bordo da mesma barcaça.
Posta a bordo a nossa bagagem, embarcamos. Eram 7 horas quando
fizemos de vela. Uma breve viagem de 2 a 3 horas, o mais tardar nos prometiam
os homens da tripulação e o Sr. André de Miranda experimentados naquele
trajeto, que compreende três légua marítimas.
Mal, porém, pensavam eles que daquela vez tinham de ver
falhar todos os seus cálculos, pretendendo marcar uma viagem que fazíamos a
mercê dos ventos. Com efeito, apenas a embarcação que nos conduzia principiou a
demandar os mares da costa, vento contrário logo soprou e toca a bordejar;
acontecendo por duas vezes que fomos tão fora, que quase perdíamos a terra de
vista.
Eram 2 horas da tarde, e nós tendo em frente a barra não a
podíamos ganhar. Ainda àquela hora navegávamos com proa de mar quando caiu o
vento nordeste, pelo qual tanto suspirávamos; virou-se então de bordo, e a
barcaça cortando suavemente as águas levou-nos à Macáo, onde aportamos às 4
horas da tarde.
Algumas pessoas em cujo número estava o Sr. Deocleciano foram
esperar-nos à praia, tomando S.Exc. a casa deste Sr. por quem fomos bem
hospedados.
Conta Francisco Othílio, que por atraso do vapor Jaguaribe,
só começaram a viagem de regresso para Natal às 9 horas dia 22 de agosto e, às
9 horas da noite já estavam em Pititinga.
Para encerrar, algumas observações: Foi em Cacimbas de
Vianna, localizada, hoje, em Porto do Mangue, que nasceu minha avó, Maria
Josefina Martins Ferreira. Batizada em Angicos, teve como padrinho o seu avô
paterno, major José Martins Ferreira, um dos primeiros povoadores da Ilha de
Macau, vindo da Ilha de Manoel Gonçalves. O major era trisavô paterno e materno
do ex-governador Aluízio Alves e materno do deputado federal Aristófanes
Fernandes.
Deocleciano, que hospedou o presidente, deveria ser o tenente-coronel,
Deocleciano Ernesto de Albuquerque Mello, que foi administrador de rendas em
Macau e agente da Companhia Pernambucana. Era pai do doutor Euclides
Deocleciano de Albuquerque, que foi vice-presidente da nossa província.
José Martins Ferreira, meu trisavô, paterno |