quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

OS LEITE DE CHAVES E MELLO NA SERRA DO MARTINS. (II)

Por Marcos Pinto

                         É  fascinante  a  constatação  do  singular  estoicismo  do  sesmeiro  FRANCISCO MARTINS  RORIZ, que  no  silêncio cheio de mistérios  daquelas  inóspitas  matas  se  atirou com largueza  pelos  sertões  adustos, atravessando  a  vastidão da  serra  do  Apodi, seguindo  veredas  indígenas, as quais  alargava  à golpes  de facão, dando vida pela dor  e pelo heroísmo a  mundos  novos, com sangue, suor e lágrimas  fecundando  o  fértil  solo  da  antiga  "Serra  do  Campo  Grande".  Não resta  dúvida  de  que enfrenta  um dilema: Prosseguir  ou recuar.  Obteve  a  patente de  Sargento-Mór  e  os  necessários  privilégios  para  desbravar  e  colonizar  aquele  recanto  ameno, no silêncio repleto  de sol.  Foi neste cenário  que  por volta do ano de  1820  se instalou  naquele  reconfortante  reduto o  não menos  intrépido  Capitão FRANCISCO  AFONSO DE  CHAVES  MELO, irmão do famigerado  Coronel  ALEXANDRE  JOSÉ  LEITE  DE  CHAVES.  Para  configuração de  liames  genealógicos  dos  LEITE DE  CHAVES  E MELO  na  "Serra do Martins", transcrevo   documento oficial  - requerimento de  abertura de  inventário, datado  de  23 de Abril de  1847:
                        " Dizem  o  Tenente  Francisco  Afonso de  Chaves  Mello, José  Leite  de  Chaves  Mello, João Quirino  Afonso de  Chaves  Mello, irmãos, filho e neto  do finado  Capitão Francisco  Afonso  Leite de  Chaves  Mello; Que falecendo  o pai e avô  dos  Suplicantes  nesta  Vila da  Maioridade, em dias do  ano  de  1844  deixara  alguns bens  que em regra de Direito, devem ser  partilhados  com os  Suplicantes  neste  Juízo  de  Órfãos, em consequência  de haverem  dois  órfãos do finado  João  Leite de Chaves, Miguel e  Antonia, menores  de  quatorze  anos, muito pelo contrário até ao  presente não se tem  procedido  dito inventário, no que tem dado motivo  alguns extravios  de  bens, assim como um escravo de nome  Joaquim, nação Angola, que o herdeiro Antonio Leite de  Chaves e Melo, morador  em  Carateús,  Província  do Piauí, de poder  absoluto  dele se  utilizou vendendo-o  para  a Cidade  do Ceará, e  nega  trazê-lo  à  colação  e  ser  partilhado  entre  os  herdeiros, persistindo  na  contumácia de não dar  em consequência  de ser  prepotente naquele lugar  de  diferente Província  aonde  jamais  poderão  os  Suplicantes  irem  cobrar dito escravo, sofrendo assim  prejuízos  os  miseráveis  órfãos, porque sendo de suma  responsabilidade  dos  Juízes de Órfãos  acautelarem todo e qualquer  prejuízo de  órfãos  como se  vê na  Ordenação.....Vem os  Suplicantes  requerer de  Vossa  Senhoria se  digne mandar  apreender ao  escravo  Antonio, fugitivo  do herdeiro devedor  Antonio  Leite, o qual  escravo se  acha  nesta Vila  também requer que deveis  assegurar  o  prejuízo por isso que sendo de  poucos bens, de fato não irá caber em herança  ao Suplicado  talvez  uma sexta  parte  do  escravo vendido  com  isso será  repartido  pelos  suplicantes  órfãos  que será de  infalível  prejuízo, a vista de que vem os  Suplicantes  pedir pelos órfãos  seus  sobrinhos  requerer  apreensão  no dito escravo  Antonio, até  a decisão da partilha, posto  em  depósito  na forma  da  Lei; Se passe Carta  Precatória  para  a  justiça  da  Vila de  Piranhas aonde  é  morador  Antonio  José  Leite, e  Alexandre  José  Leite, herdeiros, para no termo de  vinte  dias  contados do que forem citados, comparecerem neste  Juízo da  Maioridade  para  a  fatura  do  inventário, com pena de se proceder à  revelia, e como se ache na Vara  o  primeiro  Suplente  Francisco  Emiliano  Pereira, com legítimo  impedimento de  Cunhadio, se  requer  do mesmo  que se  averbando  de  suspeito, remeta  o  feito para  o segundo  Suplente  o  Capitão  José  Ignácio de  Carvalho  para  prosseguir nos demais  termos, portanto  Pede  a  V.Sa.  se  sirva  assim  o  deferir  como requerido  tem  os  Suplicantes.  23 de Abril de  1847."
                 E.R.R.J.
    Francisco  Afonso  de  Chaves  Mello.
    José  Leite  de  Chaves  Mello.
    Joaquim Afonso de  Chaves  Mello.
    João  Leite  de  Chaves  Mello.
       
            Observe-se que no dia seguinte os mesmos  Suplicantes  replicaram  em requerimento  informando  que  é  no domicílio  do falecido pai  que se  acham  a maior parte dos herdeiros. Em  requerimento datado  do dia  16 de  Setembro de  1847  informa  José  Leite de Chaves  e  Mello que se  acham ausentes  em  lugar  incerto  e  não sabido os  Coerdeiros descendentes  de  João Leite de  Chaves e Mello, cujos nomes  se ignoram, e os  Coerdeiros  Carolina, Rita  e  Violante, descendentes  do herdeiro Manoel  Álvares  Afonso, e que requerem sejam os mesmos citados por  Carta de  Editos.  Vejam que no texto  acima  afirma-se que  CARATEÚS (atual Crateús-CE)  fica  encravada  na  Província do Piauí. Ocorre que  o  Ceará  fez  uma  troca de  Parnaíba  com  Cratéus, passando  esta para  o  Ceará  e  Parnaíba  para  o  Piauí. Tal  troca deveu-se  ao fato de que  o Piauí  pretendia ter  em sua  área territorial  uma  cidade  que  fosse  litorânea, ou seja, situada  à beira-mar.
            Há uma minudência  histórica  sobre  o  fato que motivou  a  mudança de  domicílio  dos  filhos  de  Manoel Álvares  Afonso, de  nomes  ALMINO  ÁLVARES AFONSO (Advogado), MINERVINO ÁLVARES AFONSO (Professor),  DEOCLECIANO  AFONSO RIBEIRO DE MENEZES (Advogado), que residiam na SERRA  DO MARTINS, porém  com  exercício  advocatício  no  Termo do Catolé do Rocha-PB. Ocorre que  Minervino   foi  constituído  advogado  em Jericó, na Paraíba, de um desafeto de  Jesuíno  Brilhante  conhecido como Sr. Cardoso.  Ao saber  do fato, Jesuíno  passou a  perseguir  os irmãos AFONSO.  Certo dia do mês de Agosto  do  ano de 1874  o advogado   compôs uma escolta que tinha como objetivo prender  os  celerados Jesuíno Brilhante e  Manuel  Pajeú, homiziados em Jericó na casa do Professor Público  Sr. Cavalcanti de Albuquerque.  Vejamos o que diz  a missiva enviada para o jornal "Mossoroense", que publicou em sua edição de  29 de Agosto de 1874: "...Foi descoberta  a escolta -  ao aproximar-se os assassinos  Jesuíno e  Pajeú  sairam da casa, ao aproximarem-se os primeiros  cavaleiros, que com o Oficial de Justiça  lhes intimaram a  prisão. Foi então que  Jesuíno e Pajeú, reconhecendo  entre esses da vanguarda ao distinto cavaleiro e ilustre Advogado  Deocleciano Afonso que com grande valor cívico  lhes  bradou que se rendessem, desfecharam sobre ele  dois  cruelíssimos tiros que o deixaram varado de bala e chumbo, atirado do cavalo em terra, evadindo-se os celerados  porque  a  tropa de  paisanos, aterrada, não teve coragem de aproximar-se  mais  deles. O Dr. Deocleciano  recuperou sua saúde, após  intenso  tratamento  médico  na  Serra  do  Martins.  O clima de  terror  passou a reinar  na família  AFONSO, dado  as constantes  ameaças  dos bandidos  Jesuíno e  Manuel  Pajeú.  O cenário era  aterrador, conforme  carta  publicada  no "Mossoroense", edição  de  04 de Outubro de  1874, pág. 03, sob o título "O DELEGADO DO CATOLÉ", cujo missivista  revelou  o  insano  ódio do  Jesuíno  aos irmãos  Afonso: "...Todo o seu ódio, toda  a  sua folia, toda a sua  indignação  só tem por  alvo  aos  honestos  cidadãos  Almino, Minervino, Deocleciano, e outros, nossos respeitáveis amigos, porque tem a esforçada coragem de enfrentar  civicamente  as demasias  e vexames do tão enorme Delegado.".
             Após  as truculências  sofridas por seus irmãos, Almino  convenceu-os  a  mudarem  suas  residências  para  Fortaleza-CE, tendo antes  comparecido  à  redação do "Mossoroense"  para  apresentar  sua  despedida.  O certo é que  o bravo ALMINO  ÁLVARES  AFONSO  foi  um dos baluartes  no  processo da  abolição da  escravatura em Mossoró, tendo  proferido  belos discursos  no  festivo dia  da  libertação geral, ocorrida no dia  30 de  Setembro de  1883, sob a  emblemática rubrica de ter sido a  segunda cidade do Brasil a libertar  os escravos  cinco anos  antes da  famosa  "LEI  ÁUREA", assinada pela Princesa  Isabel  em  13 de  Maio de  1888.
Casarão construído por José de Souza Martins Pereira, casado com Emilia Cândida de Souza, filha do mestre de latim

OS LEITES DE CHAVES E MELO NA SERRA DO MARTINS. (I).


                            Por Marcos Pinto
                      A  paradisíaca  serra,  em  sua exuberante  beleza  natural,  contempla  os  viandantes  que  perlustram  o venerando  solo  da  antiga  SERRA  DA  MAIORIDADE  com  nostálgica e  misteriosa  transcendentalidade. Tais predicados  tem  como referencial  a  atual  cidade  denominada  de  MARTINS, no  Rio  Grande  do Norte. É  emblemática  em exponenciais  figuras  da  Magistratura  potiguar, tendo sido berço de nascimento  de  seis  Desembargadores.  O  referencial toponímico  pioneiro  foi  SERRA DO CAMPO GRANDE, denominação  constante  do requerimento do  Capitão-Mór  ALEIXO  TEIXEIRA, e da  concessão de  Carta de  Data de  Sesmaria  datada de  20.07.1736.  Aleixo era Capitão-Mór da  então  Aldeia  de  São João  Batista  dos  Tapuias  Paiacus, do  Lago Pody, atual  Apodi, onde  também  foi  concessionário, no lugar que  ficou  conhecido como "DATA DO ALEIXO".  Como o  Capitão  ALEIXO  caiu  em comisso, ou seja, não efetivou  posse  na sesmaria que lhe foi concedida, seis anos  após, precisamente  a  1º de  Março de  1742, foi  concedida a mesma  Data de  Sesmaria  ao  Capitão FRANCISCO  MARTINS RORIZ, que residia na Ribeira  do Jaguaribe, Capitania  do  Ceará, que fundou no alto da serra ainda  inabitada, uma fazenda  e  currais de gado, que passou a ser conhecida  pelo nome de seu proprietário - SERRA DO  MARTINS.
                     Emoldurando  o perfil  histórico  desta  tradicional família, detentora da nobreza de quatro costados, consigna-se que  é oriunda da Ilha Terceira, do arquipélago dos Açores. A história dessa família no Brasil começa no início do século XIX, com a vinda de Portugal, do Ajudante de Cavalaria Alexandre José Leite de Chaves e Melo. Esse militar prestou importantes serviços à coroa portuguesa.
Em 1805 acompanhou o 2º Governador da Capitania do Ceará, João Carlos Augusto de Oeynhausen em expedição ao Ipú, com o objetivo de prender o Coronel Manoel Martins Chaves e seus sobrinhos, o Capitão Francisco Xavier de Araújo Chaves e Bernardino Gomes de Franco, tendo o Ajudante José Leite, desempenhado importante papel nessa missão. Em 1817 vamos encontrar Alexandre José Leite no posto de Coronel, Comandante das Fronteiras e Inspetor das Milícias do Jaguaribe, onde impede que a REVOLUÇÃO PERNAMBUCANA DE 1817, que subvertia a ordem nas Capitanias de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, se alastrasse até o Ceará.
Quando o Crato aderiu à causa da Revolução, o Governador mandou o então Coronel Leite marchar sobre o Cariri, a fim de sufocar a revolta.
Quando se preparava para descer sobre o Cariri, eis que recebe, oriundos do Crato, onde já havia sido deflagrada a contra-revolução, os presos: irmãos Alencares (Tristão e o padre Carlos), Francisco Pereira Maia, Pereira dos Santos e José Francisco de Gouveia Ferraz, remetendo-os para Fortaleza.
Recebidos os reforços normais constantes de tropas regulares, contingentes de índios e tropas de milícias, e como já não fosse mais preciso marchar sobre o Cariri, ordenou que se postassem piquetes nas estradas que davam acesso às Capitanias vizinhas, e marchou em fins de maio para o Rio Grande do Norte, onde pacificou o Apodi, Martins, Porta Alegre e Pau dos Ferros, fazendo numerosas prisões e obrigando o povo a acatar o governo português.
                  
            Consta que ALEXANDRE JOSÉ  LEITE  DE CHAVES E MELO  trouxe da terra natal dois irmãos: Leandro Leite Chaves e Melo e Francisco Álvares Afonso Leite de Chaves e Melo, que no Brasil viveram e deixaram frondosa descendência. O primeiro ter-se-ia localizado no Rio Grande do Norte, transferindo-se depois para o Rio de Janeiro, deixando prole numerosa e ilustre.  Francisco Álvares Afonso se radicara no Rio Grande do Norte, onde deixara muitos filhos, entre os quais: Manuel Álvares Afonso Leite, Maria Afonso de Chaves e Melo Pereira “Mariazinha”, Antonio Leite de Chaves e Melo e Alexandre Leite de Chaves e Melo. 
Mariazinha casou-se com o português Francisco Emiliano Pereira, latinista e educador de grandes méritos, tendo sido professor de seu sobrinho o Senador Almino Álvares Afonso. Sua filha Maria Joaquina Chaves, “Maroca” casou-se com o primo Ildefonso Leite de Araújo Chaves e Melo.
Manuel Álvares Afonso Leite morava entre Patu e Martins, no Rio Grande do Norte, tendo deixado dois filhos: Francisco Manuel Álvares Afonso e Viriato Afonso. Viriato foi Coletor em Independência, Ceará e Advogado em Martins e Francisco Manuel era pai do Senador Almino Álvares Afonso.
             Adentrando, ainda,  na contextualidade  do  título  que encima  este  despretensioso  artigo, é  possível  afirmar  que  há possibilidades  de a  fixação  inicial dos  LEITE  DE CHAVES E MELO  na  "SERRA  DO  MARTINS"  ter sido objeto de concessões  de  atenuantes  feitas  aos  revoltosos  alí  residentes  pelo  Coronel  ALEXANDRE  JOSÉ  LEITE DE  CHAVES E  MELO, destacando-se  entre  estes a  inolvidável  figura do  Capitão  ANTONIO  ALVES  CAVALCANTI, que  é  o mesmo  Antonio Alves Cavalcanti  citado  no livro  "DOCUMENTOS HISTÓRICOS", publicação da  Fundação  Biblioteca  Nacional.  Encantado com  as  belezas  naturais  e do clima  ameno  daquela  aprazível  serra, teria  o  Alexandre, passada  a  turbulência  do movimento revolucionário, instalado  o  seu  irmão Capitão  FRANCISCO AFONSO DE CHAVES  E MELO, em terras  que teriam  sido confiscadas  dos  partícipes  revolucionários.