Fazenda do Amargoso, 1810
João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor de Matemática da UFRN e membro do INRG
A capitania do Rio Grande sempre teve vocação para a pecuária. Desde há muito tempo que abastecia o Nordeste com animais para os engenhos e para o abate. Tivemos, lá no Assu, a povoação de Oficinas onde se produzia charque. Fazendeiros de todo o Nordeste requeriam terras na nossa província para suas criações. Domingos Affonso Ferreira e seu genro Bento José da Costa, dois ricos portugueses, moradores no Recife, tinham várias fazendas no Rio Grande do Norte. Já descrevemos, em outro artigo, as ilhas que pertenciam aos dois e foram inventariadas, após a morte do primeiro, em 1804. Hoje falaremos de uma dessas fazendas.
José Álvares Lessa, morador na Ilha de Manoel Gonçalves, procurador inventariante do Coronel Bento José da Costa, em 1810, disse haver mais pertencente ao casal Domingos Affonso Ferreira e Anna Maria Theodora, lá no Sertão do Assu, além das Ilhas já descritas em outros artigos. No título de terras da Fazenda do Amargoso fez a seguinte descrição.
A Fazenda do Amargoso tem três léguas de terras que partem ao nascente com as sobras de terras do Mangue Seco; ao poente com Aroeiras; ao norte com terras da Fazenda Conceição; e ao sul com terras de Águas Novas: e mais três léguas de data das sobras das terras entre Amargoso, e Curralinho; as quais hoje servem de logradouro a dita Fazenda do Amargoso: e também mais toda a terra, que se achar da dita Fazenda da Conceição anexa a da Fazenda Amargoso, a qual parte ao nascente com o Mangue Seco, ao sul com terras do Amargoso; ao norte com a Cambôa dos Barcos; ao poente com o Rio da Barra do Amargoso, a qual terra da Fazenda da Conceição, hoje em dia, serve de logradouro pelo inverno à sobredita Fazenda do Amargoso; as quais todas ditas terras, disse o dito procurador inventariante, houve por compra feita a Francisca Rosa da Fonseca, Domingos Affonso Ferreira, e seu genro e sócio o Coronel Bento José da Costa por escritura pública nas Notas de Francisco Gomes da Fonseca, Tabelião das Vilas de Santo Antonio do Recife, as quais três léguas de terras da Fazenda do Amargoso; outras três léguas de sobras; e todas as da Fazenda Conceição, adjacentes e anexas as do Amargoso foram vistas e avaliadas pelos avaliadores, por junto, por preço e quantia de um conto de réis.
Entre outras criações, havia nessa fazenda, no ano de 1810, 4 bois de carros, 25 bois de lotes, 30 novilhos, 100 garrotes, 50 bezerros novos, 500 vacas, 30 novilhas, 100 garrotas, 60 bezerras, 24 cavalos de fábrica, 1 cavalo pai de éguas, 25 éguas novas e 100 cabras.
Um dos registros de casamento que encontrei foi de Manuel Luis, filho legítimo de Luiz, escravo da casa do finado Bento José da Costa, que morava na Fazenda Amargoso, testemunhado por Theodoro de Sousa Pinheiro e Matheus da Rocha Bezerra (avô do jornalista Pedro Avelino).
Um dos moradores dessa Fazenda foi o Capitão Francisco Trajano Xavier da Cunha, primeiro Juiz de Paz de Macau. Francisco Trajano era da Freguesia de Nossa Senhora da Apresentação da cidade do Natal, e foi primeiramente casado com Dona Marianna Ignácia Teixeira (em outro documento Maria Ignácia Fernandes Pimenta), que veio a falecer em 3 de julho de 1826, em São Gonçalo. Em 24 de novembro de 1829, no Oratório das Oficinas, ele, viúvo, casou com sua prima (3º grau de consanguinidade) Senhorinha Clara dos Anjos, filha de Carlos José de Sousa e Manoella Archangela dos Anjos. Uma das testemunhas foi Manoel da Rocha Bezerra que era casado com Josefa Jacinta, uma irmã de Dona Senhorinha. Manoel era irmão do Professor Matheus da Rocha Bezerra, citado acima, ambos filhos de Balthazar da Rocha Bezerra e Josefa Maria da Silva (ou Josefa Barbosa da Silva).
Na área compreendida no entorno da Fazenda Amargoso, em 1839, houve uma audiência de conciliação, na casa do Juiz de Paz substituto, André de Sousa Miranda, por conta de uma disputa das sobras denominadas Canafístula, da data de Curralinho e Águas Novas, tendo como autores os Capitães Francisco Trajano Xavier da Cunha, Jacintho João da Ora, José Pedro da Silveira, e o tenente-coronel João Marques de Carvalho, e como réus o capitão João Martins Ferreira e sua mulher dona Josefa Clara Lessa. João Martins e Josefa Clara tinham sido padrinhos, em 16 de setembro de 1834, de José, filho de Francisco Trajano e Senhorinha, sendo que a madrinha foi representada por Antonia Bernarda Achyoles, uma irmã de Senhorinha. Antonia foi casada com um filho de Alexandre José Pereira, que em 1818 era comandante do degredo da Ilha de Manoel Gonçalves.
Em 1843, André de Sousa Miranda foi padrinho de Thereza, filha de Francisco Trajano, junto com Maria Ludovina de Sousa, esta por procuração de Joaquina Maria da Transfiguração.
Joanna, filha de Francisco Trajano e Senhorinha, foi batizada em 1845, no sitio Amargoso, tendo como padrinhos Leandro Gomes de Miranda e Leonor Ferreira Barbosa por procuração que apresentaram Francisco Xavier da Cunha (mesmo nome do pai de Francisco Trajano) e Maria Ludovina de Miranda. Nessa mesma data, e no mesmo sitio Amargoso, foi batizada Cândida, filha de Francisco Xavier da Cunha e Maria Ludovina de Miranda, tendo como padrinhos Francisco Trajano e Senhorinha.
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