terça-feira, 7 de outubro de 2014

O Acre na visão de Pedro Avelino




João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, membro do IHGRN e do INRG
Em fevereiro de 1912, o major Pedro Avelino foi procurado pelo jornal “A Imprensa”, onde, anteriormente, fez parte da redação. Ele tinha acabado de regressar do Acre, onde exerceu o cargo de Prefeito do Departamento do Alto Juruá. Nessa entrevista, ele descreve como era o Acre, o departamento do Alto Juruá, e, também, os acontecimentos que antecederam a sua saída do cargo.

Seu ex-colega de redação, do renomado jornal, foi recebido, em sua residência à Rua Imperial, nº 151, no Meyer. O major Pedro Avelino começou sua entrevista descrevendo o Território, onde viveu com sua família, como segue.

 O Acre, desejando autonomia, é todo um campo de grosseiras explorações de toda ordem.
A sua população heterogênea e absolutamente cosmopolita não oferece nenhum traço étnico e – o que é fantástico – toda ela se forma de elementos aventureiros, que permanecem na região com o intuito único, exclusivo, de ganhar dinheiro, de fazer fortuna; este intuito é uma verdadeira e perigosa alucinação, que empolga a muitos, quase todos, sem distinção, e arrasta à prática arriscadíssima dos atos mais audaciosos em alguns, mais cínicos, mais miseráveis em outros.

Esta população, sem amor à terra, entrega-se, como é fácil compreender, ao fito que ali a reuniu, completamente despida dos mais comezinhos escrúpulos peculiares à luta pela vida entre cidadãos de uma sociedade organizada. A sociedade do Acre, não é, pois, uma sociedade: é sim um estranho amálgama de aventureiros, repito, sempre em movimento, sempre a fluir e a refluir na sua configuração física, como as próprias águas do Amazonas: e o que a move é a ambição, a ambição desmarcada, vesânica, perfeitamente doentia, para não dizermos criminosa. 

Essa massa inquieta de homens a viver na vertigem da exploração, podemos dividi-la: uma parte que é mínima, feita dos que conseguiram fortuna e tem propriedades e passa o maior número de meses do ano passeando e gastando o que ganhou e ganha na Europa; e outra parte feita dos que se viciaram ao ambiente, às sensações da caça ao dinheiro, ao sonho do “El-dourado”, que nasce do próprio solo; esta parte constitui a legião dos que infundem receio e desconfiança, porque é toda ela a vasa moral das demais: dizendo, assim, creio tê-la classificada, precisamente: são indivíduos de variadíssimas cataduras, vindos do Peru, do Chile, da Bolívia, da Argentina, de todos os nossos Estados e mais italianos, turcos, norte-americanos, alemães, enfim tipos de toda parte do mundo, superabundando os sul-americanos; estes indivíduos, tarados pelo destino, são amantes da desordem, profissionais do desrespeito, avesso a tudo que lhes pareça autoridade, rebeldes ao cumprimento de qualquer lei: e vivem assim, exagerando com ostensiva animosidade os erros conscientes que viram os seus maiores, na região praticar.

Esta, em traços rápidos, é a população do Acre, disse o Sr. major Pedro Avelino, fazendo pausa.

Questionado pelo entrevistador, continuou descrevendo sobre o departamento do Alto Juruá.

É o maior dos três Departamentos do Acre, o maior e o mais populoso, com grandes encargos financeiros. É o único servido por dois vapores e por duas lanchas que são “Tavares de Lyra”, “Acreano”, “Juruá” e Leopoldo de Bulhões”.

A cidade do Cruzeiro do Sul, sede do Alto Juruá, está localizada num planalto, e é muito salubre: como paisagem é um belo trecho da natureza: a cidade Cruzeiro do Sul conta com dois mil habitantes, é iluminada à luz elétrica, tem um pequeno teatro e um cinematografo, uma fábrica de gelo, certa vida comercial, algumas casas de comercio de primeira ordem; escolas primárias e uma Escola Modelo, fundada por mim a quem dei o nome de Escola Modelo Hermes da Fonseca. Em todo departamento do Alto Juruá existem quarentas escolas primárias, mantidas pela Prefeitura.

Em Cruzeiro do Sul existe, também, o semanário “Cruzeiro do Sul”, havendo também outro semanário “ O Município”, na Vila Seabra, vila que é sede da região de Taranacá; devo-lhe informar que em Cruzeiro do Sul há ainda uma Olaria, montada pela Prefeitura.

No próximo artigo daremos continuidade à entrevista, destacando os motivos que levaram o jornalista Pedro Avelino a abandonar o cargo de Prefeito.
Isolina Waldvogel, filha de Pedro Avelino

2 comentários:

  1. Meu nome é ALdo. Acabava de postar meu cometário, bem positivo sobre a entrevista, o artigo, seu coneúdo e estilo. Infelizmente, essa minha primeira tentativa faliu porque nada do que escrevera apareceu... nao há problema, reitero a satisfaçao por ter lido esse texto e me congratulo consigo por tê-lo postado.

    Obrigado, aldo

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