sábado, 23 de abril de 2011

Corsários ingleses na Ilha de Manoel Gonçalves, 1818


João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor de Matemática da UFRN e membro do INRG
Manoel Rodrigues de Melo escreveu na Revista Bando um artigo, intitulado O Saque da Ilha de Manoel Gonçalves, baseado no livro Documentos do Arquivo – Presidentes de Províncias (1818) - editado pela Secretaria de Interior e Justiça de Pernambuco no ano de 1943. Quando estive em Recife, recentemente, fiz imagens de tais documentos, entre eles as duas correspondências emitidas da Ilha de Manoel Gonçalves que transcrevo aqui.
A primeira é uma carta do Comandante do Degredo da Ilha de Manoel Gonçalves, Alexandre José Pereira, para o Capitão Manoel Varella Barca, carta esta copiada pelo Padre Manoel Pinto de Castro que servia de Secretário do Governo da Província do Rio Grande.
Ilustríssimo Senhor Capitão Manoel Varella Barca//Ilha de Manoel Gonçalves, 13 de Dezembro de 1818//.
Dou parte a Vossa Mercê que ontem, treze de Dezembro do corrente, às onze horas do dia, deu fundo fora da Barra do Amargozo um Corsário de ladrões estrangeiros armado em guerra, com muito armamento, e entraram nos seus lanchões de tarde dentro do Rio, e roubaram cinco Sumacas, e conduziram tudo para seu bordo, e ainda se acha ancorado no mesmo lugar, e penso ser com intenção de virem saquear, e roubar a terra; aqui se acham alguns homens, mas sem armas, e creio que tudo se acabará, aqui já se acham pelo que diz seis feridos com tiros que fizeram para terra, e a mais da gente desta praia vejo esmorecidos, e eu pior que nenhum, pois me acho doente para morrer, Vossa Mercê mandará o que for servido// Deus Guarde a Vossa Mercê por muitos anos// De Vossa Mercê atento súdito// Alexandre José Pereira// Comandante deste Degredo Ilha de Manoel Gonçalves.
Entre as cartas do nosso Governador para o da Província de Pernambuco, Luis do Rego Barreto, há uma, datada de 31 de Dezembro de 1818, onde ele escreve: Entre as diferentes partes que tive sobre este objeto, a que me parece mais correta, e circunstanciada, foi a de um morador da Ilha de Manoel Gonçalves correspondente de Bento Joze da Costa, que por isso a ofereço na Cópia N1 para com ela informar a Vossa Excelência do que se passou no Assu.
N1. Ilustríssimo Senhor Governador Joze Ignacio Borges.
Participo a Vossa Senhoria, que no dia 12 do corrente, pelas onze horas da manhã, apareceu, três léguas a Leste desta Ilha à popa, uma Escuna com um sinal, ou bandeira estranha no mastro de proa e veio fundiar defronte da Barra do Amargozo a barlavento da Sumaca Santa Rita Galatéa de Pernambuco, que se achava fora acabando de carregar de peixe de vários negociantes destas praias, e logo que fundiou, mandou o Comandante desta a bordo uma jangada com três homens saber o que queriam, disseram, que refresco de aguada, e mantimento, que aquela embarcação era Inglesa, e de guerra.
 Os ditos jangadeiros viram muito armamento, gente de toda a nação; imediatamente que largou de bordo a dita jangada, largaram eles três escaleres, ficando um a bordo da dita Sumaca Santa Ritta, e dois entraram na Barra do Amargozo, e achando-se ancoradas naquele Rio, com distancia uma das outras, quatro embarcações, a saber, o Penha, e Victoria de Pernambuco, Conceição, e Almas da Paraíba, e Flor do Mar de Goiana, e atracando o primeiro escaler a bordo do Penha, armados tomaram conta da embarcação, e o segundo seguiu de rio acima, e atracando no último vazo também  armados, principiaram a roubar dinheiro, roupa, maçame, e escravos, e da mesma forma continuaram nas mais embarcações até chegarem de regresso na Penha, e incorporando-se  com os que estavam já de posse da Sumaca, meteram os oficiais, e a Campanha no Castelo, e continuaram o saque, estando em terras no Pontal do Amargozo os passageiros que tinham vindo no Penha, e moradores; entraram-lhe a fazer fogo de bordo, ferindo de bala quatro dos moradores, a fim de melhor conduzirem o saque nos escaleres, e na lancha do Victoria, que levaram com seis escravos do Penha e Victoria, três homens forros, tudo feito na tarde  que ancorou.
Imediatamente que soube nesta Ilha fui com dez homens daqui por terra mais de uma légua, tomando em caminho seis do Lagamar, e chegando já de noite, tinham saído.
No dia 14 vimos por um óculo de terra estarem saqueando o Santa Ritta, e no dia 15 indo eu, e os mestres das Sumacas Penha e Victoria, e os passageiros a bordo do Penha, ver o estrago que teriam feito, e chegando, tendo deixado os moradores desta Ilha prontos de pólvora, e bala com as poucas armas de fogo que há de guarda a Ilha, viu largar de bordo da dita Escuna, os três Escaleres, e providenciando-se esperá-los na Barra do Amargozo, aqui não vieram, e foram a boca do Rio, distante desta duas léguas saquear seis casas de palha que tem, porém pouco ou nada acharam.
No dia 16 pelas quatro horas da tarde, estando parte dos habitantes desta, e de Guamaré juntos de guarnição à Ilha, viram entrar na Barra do Amargozo o escaler grande carregado de gente, e tornando a abordar as Embarcações á conduzir o resto do que ainda lhe faltava, e pegando a lancha da Sumaca Conceição e Alma saíram.
No dia 17 pelas duas horas da tarde mandaram para terra a dita lancha pelos marinheiros forros que lá tinha das Sumacas, e um passageiro carregador de peixe no Santa Ritta, e o Contramestre da mesma, e mandaram dizer ao Comandante que lhes mandasse um Prático para os botar fora da Ponta Gorda, que queria ir pelo canal, e se o não fizesse até as quatro horas da manhã, que havia mandar atacar esta Ilha, e tocar fogo nas casas, e nas Sumacas, porém destas ameaças caso nenhum se fez.
No dia 18 de manhã se viu velejar a Escuna para barlavento. Contam os marinheiros que lhes ouviram dizer que iam para America Espanhola, e que ainda haverão de andar três meses fora, e que iam esperar os navios que haviam saído de Lisboa para o Brasil, e Índia, e que a gente que traz são noventas e oito pessoas, e que já tinham feito três presas, que as tinham mandado para America Inglesa de onde tinham saído cento e tantas velas. A fortificação que traz são seis peças por banda de 12, e uma na proa de rodízio de 18; este malvados vão de Costa acima esperar as embarcações que navegam na costa do Sertão até o Maranhão, e Pará.
Eu tenho aviso de Pernambuco do coronel Bento Joze da Costa, que nas águas próximas da lua nova despedia para esta a Sumaca Xica, e em Janeiro o Brigue São Manoel
Deus Guarde a Vossa Senhoria, Ilha de Manoel Gonçalves, 18 de Dezembro de 1818. João Martins Ferreira.

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