João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor de Matemática da UFRN e membro do INRG
No começo aqui viviam somente os índios com suas crenças e seus deuses, guerreando entre si e comendo uns aos outros. Aí vieram os portugueses: alguns aventureiros, outros fugindo da intolerância da Igreja ou degredados pela inquisição. Em seguida os portugueses arrastaram à força, para cá, os índios das mais diversas nações africanas. As nossas riquezas trouxeram, ainda para cá, outros estrangeiros. A ocupação era traumática e difícil, por conta da dimensão do país e da disputa com os habitantes naturais. Muitos morreram. Os que foram sobrevivendo iam construindo a nossa nação da forma que podiam, sem muita ajuda da coroa portuguesa, mas muito pelo contrário, sendo espoliados de forma vil.
Durante todo esse tempo, muitas contendas e revoltas: a guerra contra os holandeses, a guerra dos palmares, a guerra dos bárbaros, a inconfidência mineira, a revolução de 1817, a confederação do equador e tantas outras pelo Brasil afora. Não foi fácil!
Mas que país temos hoje? Depois de tantos anos e tantas lutas que qualidade de vida temos? Como é a vida deste Brasil de hoje?
Os avanços tecnológicos e da ciência estão presente na vida dos brasileiros. Ande pelos mais distantes rincões deste país e avistarás no topo da casa mais miserável uma antena parabólica e na mão dos mais desprovidos dos seres um celular. E daí, isto é cidadania? Isto é qualidade de vida?
Nossos parlamentos ou nossos governos são ocupados, não por eleitos que se corromperam, mas por corruptos que se elegeram. A corrupção antecede a eleição. A chegada ao poder é precedida de enganações, compra de votos com dinheiro, com imagem, com propaganda enganosa e com apelos religiosos.
Para exemplificar, vi, no ano que passou, um candidato que na eleição anterior foi campeão de votos, e que na de 2010 dizia, despudoradamente, que antes os eleitores não o conheciam tão bem. Realmente, era um novato por aqui, que foi votado em quase todas as cidades, mas que muitos nunca tinham ouvido falar dele. Outro fato lamentável, e que não sensibiliza o cidadão é a eleição de suplentes de Senador e vice - qualquer coisa. Tem que mudar!
Há uma passividade que incomoda. Estamos inertes. As revoltas do passado não nos alcançam mais. O consumismo material, religioso e midiático, nos anestesia. Enquanto no exterior assistimos a revolta de muitas nações contra os seus mandatários que não querem largar o osso do poder, aqui vemos se perpetuarem na política, direta ou indiretamente, muitas famílias. É o poder que gera poder. Quem quer arriscar no novo? Que chance tem o novo de chegar ao poder, sem corromper?
Os poderes constituídos neste país agem sem prioridades magnas. Eles atuam sem nenhuma filosofia que vise o bem comum. São ações isoladas que se baseiam em forças não perceptíveis. Muita mídia e poucos resultados.
Nossa educação e nossa saúde são compostas de números que retratam coisas materiais. A dor e a ignorância nos maltratam diariamente, sem dó nem piedade. A lei de responsabilidade fiscal não tem impedido a construção de novas obras, mesmo existindo uma quantidade de outras inacabadas.
Enquanto amargamos situações deploráveis na segurança, na educação e na saúde, assistimos mais uma irresponsabilidade dos nossos governantes com o beneplácito dos brasileiros: A copa de 2014. Não estávamos preparados para sediá-la. Mas fomos disputar a chance de ser sede por pura vaidade ou incompetência administrativa. Vamos gastar rios de dinheiro, em detrimento do essencial para as nossas vidas. Muitas balelas são colocadas na defesa dessa realização. O Brasil, o Rio Grande do Norte ou Natal serão vistos e conhecidos pelo mundo todo. E daí? Se já não nos conhece é pura incompetência nossa ou deles.
Assim como muitos ficam ricos nas eleições, outros tantos vão ficar mais ricos com a realização da copa. A própria FIFA vem vender suas bugigangas por aqui.
O Centro Administrativo, o Machadinho e o Machadão foram construídos com muito sacrifício. Ao longo do tempo, muitas dívidas foram contraídas e algumas nem terminaram de pagar para construir e manter aqueles próprios. Quantas reformas foram feitas naquela região com recursos de empréstimos?
A destruição daqueles locais é um crime de lesa-patrimônio e deveria ser o centro de revolta da população. Mas o futebol é outro componente que nos anestesia. Vejam a loucura das torcidas nos estádios de futebol. Qual é o político ou fiscal da lei que vai enfrentar aquela turba enfurecida?
Sempre gostei de futebol. Quando menino jogava quase todos os dias. Além disso, assistia jogos levado por meu tio afim, Evilásio Rocha (no seu velório tinha uma bandeira do ABC sobre seu caixão, enquanto tocava o hino do clube). Algumas vezes subia em uma caixa d'água que tinha em um abrigo vizinho ao Estádio Juvenal Lamartine para ver os jogos. Mas, sou contra a realização da copa em 2014, aqui no nosso Estado, por que ela está sendo feita de forma incorreta e abusiva. Qualquer coisa que ela poderia nos trazer de benefícios, pode ser conseguida de uma forma mais criteriosa e decente.
Não precisamos de um novo Estádio. Precisamos, sim, de mais Hospitais, maternidades, escolas, aeroportos decentes, mais segurança, mais cuidados com todas as cidades de nosso Estado. Os números nas áreas mais importantes para a qualidade de vida são preocupantes. A Copa está nos desviando das questões fundamentais deste país. Os municípios brasileiros terão menos recursos com a realização da Copa. Se faltam recursos para as coisas básicas, com certeza faltarão mais ainda por conta da Copa. As contrapartidas, os empréstimos comprometerão mais ainda a qualidade dos serviços prestados pelos governos. As obras, como sabemos, demandarão muitos aditivos, e por conseqüência mais recursos.
Já estão articulando a reforma do Juvenal Lamartine. Novos recursos serão destinados para isso. Mais problemas no trânsito, mais contratos, mais aditivos e mais espertezas. A nossa cidade está com o futuro comprometido. As dívidas, que já são muitas, ficarão ainda maiores. Os políticos vão reclamar na época da eleição e depois quando se elegeram, mas não fazem nada agora.
Contra a Copa, a favor de Natal e do Rio Grande do Norte!
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